A associação entre o consumo de ultraprocessados e o desenvolvimento de obesidade ganhou mais um indício para o seu já robusto conjunto de evidências científicas. Realizado pelo Nupens, um novo estudo analisou informações da população australiana e concluiu que a ingestão destes produtos está relacionada à obesidade.

O artigo é resultado da tese da cientista Priscila Machado, e é assinado por outros oito pesquisadores, sendo quatro deles também integrantes do Núcleo. Confira, na íntegra, a pesquisa na revista científica Nutrition & Diabetes, da Nature (em inglês).

Para chegar à conclusão, a equipe avaliou dados da Pesquisa Nacional de Nutrição e Atividade Física da Austrália, aplicada entre 2011 e 2012. Informações antropométricas (como o Índice de Massa Corporal) e de alimentação de cerca de 7500 australianos (com 20 anos de idade ou mais) entraram no estudo.

A análise da alimentação foi feita com base na classificação NOVA, que separa os alimentos de acordo com a finalidade do processamento, gerando as categorias “in natura ou minimamente processados”, “ingredientes culinários”, “processados” e “ultraprocessados”.

A conclusão é a mesma de estudos similares realizados no Brasil, Estados Unidos, Canadá e Reino Unido.

 

Pioneiro

Este foi o primeiro estudo australiano a analisar a associação entre consumo de alimentos ultraprocessados e indicadores de obesidade. Segundo o Instituto Australiano de Saúde e Bem-Estar, o sobrepeso e a obesidade atingem dois em cada três cidadãos do país.

“Os mesmos resultados foram observados em todas as faixas etárias, sexo e nível de atividade física”, explica Machado. “Mostram, inclusive, que ser ativo não protege os indivíduos dos malefícios do consumo de ultraprocessados para obesidade.”

Segundo a cientista, a entrada de alimentos ultraprocessados na dieta australiana ocorreu mais cedo do que no Brasil, acompanhando as tendências dos EUA e Reino Unido.

“Na Austrália, o consumo destes produtos é o dobro do observado no Brasil, e a prevalência de obesidade também é muito maior”, diz, alertando que a população brasileira pode atingir os atuais patamares australianos se políticas para redução do consumo de alimentos ultraprocessados e de proteção da nossa culinária tradicional não forem adotados.

 

Não há quantidade segura para consumo de ultraprocessados

É comum que interessados na venda de produtos ultraprocessados aleguem que estes alimentos cabem em uma dieta saudável, desde que consumidos com moderação. Para a pesquisadora, este argumento leva o consumidor ao engano quanto aos potenciais malefícios dos alimentos ultraprocessados e banaliza a presença destes produtos na alimentação.

“Não há evidências quanto ao que significa um consumo seguro de alimentos ultraprocessados. Além disso, estes produtos são formulados para não serem consumidos com moderação, estimulando um comer compulsivo e excessivo”, diz Machado, lembrando da hiperpalatabilidade gerada pelas altas quantidades de açúcar, gordura, sal e aditivos. “Eles geralmente possuem poucos alimentos inteiros, o que os faz ter baixo poder de saciedade.”

 

Possíveis ações

A conclusão da pesquisa na Austrália indica que, assim como a entrada dos produtos ultraprocessados na alimentação é um fenômeno globalizado, seus efeitos deletérios na saúde humana (e planetária) também o são.

A cientista comenta que os resultados reforçam a necessidade de estabelecer políticas públicas que considerem os malefícios do consumo de alimentos ultraprocessados e, assim, criem ações claramente direcionadas a estes produtos.

Um exemplo é incluir a recomendação sobre evitar o consumo em guias alimentares, algo já feito pelo Guia Alimentar para a População Brasileira, ou apoiar os consumidores na identificação de ultraprocessados por meio de uma rotulagem frontal de advertência.

Outras ações importantes seriam a regulação do controle do mercado pelas grandes corporações de alimentos, restringindo suas vendas em cantinas escolares e instituições públicas, banindo o marketing direcionado às crianças e impondo taxações.

Leia a íntegra do estudo (em inglês).