Comportamento alimentar infantil

Por nutricionistas Bruna Zillesg Borges dos Santos, Thamires Merino Rios e Vanessa Sayuri Nagaishi

Educação alimentar e nutricional é mais do que dizer NÃO. Conheça como se forma a relação das crianças com o alimento e como você pode ajudá-las nessa fase.

Recentemente, está sendo veiculada na mídia propaganda de uma campanha contra a obesidade infantil em que os pais são aconselhados a falar “NÃO” para os desejos dos filhos por alimentos como salgadinhos, balas e outros. Segundo a campanha, as crianças utilizam diferentes artimanhas para convencer os adultos, como berrar, xingar, chorar, ameaçar e se jogar no chão. Esse vídeo nos fez refletir sobre as dificuldades que os adultos, pais, professores e profissionais da saúde, enfrentam para lidar com a alimentação das crianças nessa fase. Por isso, fomos pesquisar o que a ciência da Nutrição já estudou sobre o assunto e como pode nos ajudar na prática.

O comportamento alimentar começa a ser formado desde os primeiros anos de vida e o que é aprendido na infância se reflete nos hábitos alimentares da idade adulta. Além disso, mudanças de comportamento com o avançar da idade tendem a ser mais difíceis de serem alcançadas. Por isso, é importante que os adultos compreendam como se forma esse comportamento das crianças em relação à alimentação para auxiliar no desenvolvimento de hábitos saudáveis.

Não raro os pais se queixam de que seus filhos não querem comer e utilizam de estratégias para conseguir alimentá-los, como insistir de forma rígida a comer os alimentos considerados bons, proibir de comer os considerados ruins, utilizar a televisão como distração e oferecer recompensas. Entretanto, o resultado obtido com essas atitudes nem sempre é o esperado.

De 2 a 6 anos de idade, a velocidade de crescimento da criança diminui e aumenta seu interesse por conhecer o ambiente, se distraindo facilmente, o que pode tornar o momento da refeição pouco atrativo. Outra característica dessa fase é que o comportamento alimentar é determinado pelas preferências alimentares, ou seja, essas crianças tendem a comer apenas o que gostam entre os alimentos disponíveis no seu ambiente, recusando aqueles de que não gostam. Aliado a isso, é muito comum nessa idade a chamada neofobia alimentar, em que as crianças têm medo de experimentar novos sabores e alimentos.

Assim, para permitir a incorporação de novos componentes à alimentação, a criança precisa aprender a gostar dos novos sabores. Sim, aprender a gostar! O sabor do novo alimento é associado com as sensações da criança ao experimentá-lo. Se essas sensações forem positivas, favorecem que ela aprove esse sabor. A criança precisa experimentar pelo menos 10 vezes para que possa dizer se gosta ou não. É importante que ela experimente, mesmo que em quantidades pequenas. E, caso não queira, não precisa comer tudo do novo alimento.

Alguns alimentos, entretanto, em especial os doces e gordurosos, conquistam a preferência dasshutterstock_97914083 crianças com mais facilidade e isso é explicado pela ciência. A predileção ao sabor doce é natural e aparece desde o nascimento. Alimentos desconhecidos naturalmente adocicados ou quando associados ao açúcar são melhor aceitos pelas crianças. Alimentos mais calóricos, como os ricos em gordura, dão mais saciedade, o que é percebido pelo corpo como positivo. Além disso, são mais saborosos, cremosos e fofos, favorecendo o gosto dos pequenos por eles.

Temos 10 sugestões para lhe ajudar com a alimentação das crianças:

  1. Diminuição da fome e do interesse pelo alimento é normal nessa idade. Tenha paciência e procure entender o porque ela não quer comer. Coloque pouca comida no prato, se a criança pedir (porque gostou do prato ou está com fome), então dê mais um pouco. As crianças nessa idade têm o volume do estômago pequeno, com capacidade de 200 a 300 mL, equivalendo de 1 a 1,5 xícaras de chá.
  2. Proporcione um ambiente tranquilo e agradável para as refeições. A hora de comer precisa ser um momento prazeroso. Só assim o oferecimento de um novo alimento pode ser associado com uma sensação positiva. As crianças aprendem brincando. Que tal utilizar brincadeiras e formas lúdicas para apresentar os alimentos? Faça pratos decorados e deixe que ela decore seu próprio prato. E não vale tentar esconder os alimentos no meio de tudo isso. A criança precisa saber o que é brócolis, por exemplo.
  3. Respeite os horários das refeições. Estabeleça horários para comer e não permita que a criança belisque alimentos entre as refeições. Se no lanche da manhã a criança não quis a fruta, não compense com bolachas, iogurtes ou outras coisas. Espere até a próxima refeição para oferecer outros alimentos.
  4. Varie o cardápio. É importante que a criança seja apresentada a diversos alimentos e que possa experimentar, mesmo que em pequenas quantidades. Lembrando que é necessário experimentar pelo menos 10 vezes para que a criança aprenda a gostar. Assim, pode-se variar a forma de preparo e apresentação deste, oferecendo, por exemplo, a cenoura cozida, crua em saladas, em forma de purê, bolo, entre outros.
  5. Procure fazer as refeições junto com a criança e sem distrações. É importante que a criança coma na mesa e na companhia de um adulto, que servirá de modelo e interagirá com ela. Crianças nessa fase observam e imitam as pessoas a sua volta, sendo que familiares, professores e até os coleguinhas podem servir de exemplo para o seu comportamento. Desligue a televisão e evite outras distrações no horário das refeições.
  6. Permita um pouco de bagunça e sujeira na hora das refeições. A criança conhece o alimento à sua maneira e algumas precisam tocar os alimentos com as mãos. Com o exemplo do adulto, ela vai aos poucos aprendendo a usar os talheres e a se comportar à mesa.
  7. Estimule-a a fazer seu próprio prato e a comer sozinha. A criança pode se alimentar utilizando talheres e sem precisar receber a comida na boca. Isso favorece a autonomia e ela aprende a colocar no prato apenas a quantidade que vai comer.
  8. Se ela não “limpou o prato” não a force a fazer isso. Talvez signifique simplesmente que já está satisfeita. Forçar a comer faz com que a criança aprenda a ignorar sua sensação de fome e saciedade, perdendo a capacidade natural de controlar a quantidade de alimento a ser ingerido e, assim, poderá depender de sugestões externas para começar e parar de comer.
  9. Deixe que elas ajudem no preparo das refeições. Leve os pequenos para um passeio na feira para que conheçam as frutas, legumes e verduras e decidam quais querem comprar. Na cozinha, envolva-os na preparação, permitindo, por exemplo, que misturem, amassem e adicionem os ingredientes.
  10. Não utilize a comida como presente, nem castigo. O uso de estratégias de reforço com alimentos como, por exemplo, Acabe de comer suas cenouras e você poderá comer o pudim” pode produzir um efeito imediato, fazendo com que a criança coma a cenoura naquele momento. Entretanto, a longo prazo, promove uma ação negativa na preferência deste alimento, não favorecendo a incorporação dele como um hábito.

Tente incorporar as mudanças aos poucos, sem exageros e neuras na alimentação da criança. Com pequenas atitudes podemos favorecer uma relação harmoniosa com a comida e a formação de bons hábitos alimentares dos pequenos, o que trará benefícios ao longo da vida.

REFERÊNCIAS:

Meu Pratinho Saudável. 2012. Disponível em: <http://meupratinhosaudavel.com.br/>. Acesso em: 15 fev. 1992.

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