Com foco na população britânica, pesquisa foi publicada na revista científica Plos One

Ultraprocessados: alto consumo destes produtos está intimamente associado a um maior risco de desenvolvimento de obesidade

Desde o surgimento da classificação NOVA de alimentos, cientistas de diversos países têm se dedicado a entender as relações entre o consumo de alimentos ultraprocessados e a obesidade. Nas últimas semanas, mais um estudo reforçou as evidências sobre o potencial nocivo destes produtos à saúde humana.

A pesquisa “Consumo de comida ultraprocessada e risco de obesidade na população do Reino Unido” foi publicada no European Journal of Nutrition, e é assinada por cinco integrantes do Nupens, liderados pela pesquisadora Fernanda Rauber.

O estudo analisou dados alimentares e de saúde de mais de 20 mil britânicos de 40 a 69 anos, cruzando informações para avaliar as associações entre a alimentação e possíveis impactos em medidas como o Índice de Massa Corporal (IMC) e a circunferência abdominal.

Como resultado, o grupo notou que o alto consumo de alimentos ultraprocessados está associado ao aumento tanto do IMC quanto da circunferência abdominal, fatores intimamente relacionados à obesidade. 

“Nosso estudo mostrou que um aumento de 10% no consumo de alimentos ultraprocessados foi associado a um aumento de quase 20% na prevalência de obesidade em homens e mulheres”, diz Rauber. 

“Isso é especialmente alarmante no Reino Unido onde mais da metade das calorias (54%) consumidas pela população adulta vem de alimentos ultraprocessados. Sabemos que a obesidade é determinada por muitos fatores, mas também sabemos que o consumo crescente de alimentos ultraprocessados é um dos fatores evitáveis que tem forte influência na pandemia da obesidade, e esse é provavelmente o aspecto mais importante a ser considerado nas políticas públicas.”

Segundo a cientista, vários mecanismos podem explicar a ação nociva dos ultraprocessados. Um deles é a composição do produtos: altas quantidades de açúcar, sal e gorduras saturadas e trans, e baixos teores em proteínas, fibras, vitaminas e minerais. É um perfil nutritivo conhecido por aumentar os riscos de doenças crônicas, como diabetes e obesidade.

Além disso, os produtos que sofrem excesso de processamento são ricos em aditivos que alteram sua cor, sabor e textura. Com isso, surgem alimentos hiperpalatáveis (com sabor excessivamente pronunciado) e viciantes. 

“Isso danifica os processos cerebrais que sinalizam a saciedade e controlam o apetite e provoca o consumo excessivo e ‘despercebido’ de calorias”, explica Rauber. “Esses aditivos associados às técnicas de processamento que levam a desconstrução da matriz alimentar original também têm sido associados a alterações metabólicas que promovem doenças inflamatórias, com implicações para o peso corporal.”

Pesquisa contraria resultado de estudo anterior

O trabalho publicado no European Journal of Nutrition teve desfecho oposto em relação a outro estudo, de 2015, que analisou dados mais antigos da população do Reino Unido. A pesquisa anterior não encontrou associação entre o consumo de alimentos ultraprocessados e processados e as mudanças no peso corporal. Em função deste resultado, a investigação foi amplamente utilizada pela indústria de alimentos.

Segundo Rauber, há muitas diferenças nas metodologias entre as duas pesquisas, mas uma delas é principal. “No estudo publicado em 2015, os autores colocaram alimentos processados e ultraprocessados em um mesmo grupo”, aponta Rauber. Segundo a classificação NOVA de alimentos, são categorias distintas: enquanto os processados toleram adição de alguns ingredientes (como sal e açúcar), os ultraprocessados alteram a matriz do alimento, e adicionam ingredientes que, em geral, tem uso exclusivo da indústria.

Estudos anteriores já mostraram que alimentos processados, de fato, não são associados à obesidade — o que não vale para os ultraprocessados. “Nossos resultados corroboram os achados de grandes pesquisas realizadas em outros países que mostraram que o consumo de alimentos ultraprocessados está associado à obesidade.”

Leia a pesquisa na íntegra (em inglês).