Foto: EBC/Agência Brasil
O estudo “Desafios da Atenção Básica no enfrentamento à pandemia de Covid-19 no SUS” acaba de divulgar os resultados da sua segunda onda, referente a informações coletadas entre entre 15 de julho e 12 de novembro de 2021 em Unidades Básicas de Saúde (UBS) de todo o país. Trata-se do seguimento de um survey online aplicado em junho de 2020 junto a profissionais e gestores da Atenção Básica, na ocasião da primeira onda da pandemia.
Nesta etapa, o trabalho realizado pela Rede de Pesquisa em APS/ABRASCO com apoio da Organização Panamericana de Saúde (OPAS) e Associação UMANE -e contando com a Professora Aylene Bousquat da FSP-USP como uma das coordenadoras-, foi feito um estudo transversal no formato de inquérito, com uma amostra aleatória de 945 UBS brasileiras, com representatividade em nível nacional e para cada uma das cinco regiões brasileiras. Aylene coordena o trabalho ao lado de professores da Fiocruz, UFMG, UFPEL e UFSC.
Os resultados revelam uma radiografia das UBS do país no que se refere à disponibilidade de Equipamentos de Proteção Individual e treinamentos, à organização do trabalho para a atenção à COVID-19 e também à continuidade do cuidado aos usuários; à vigilância em saúde; à atuação dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) no combate à pandemia; às ações de apoio social no enfrentamento da Covid-19, e também relativas à vacinação contra a COVID-19, bem como os reflexos da pandemia no trabalho na Unidades.
“Os resultados ressaltam o importante papel que a Atenção Primária à Saúde (APS) brasileira vem desenvolvendo, principalmente as equipes da Estratégia Saúde da Família, a despeito das dificuldades do cenário pandêmico e da ausência de coordenação nacional. A pesquisa reflete as diferenças regionais e a heterogeneidade do processo de trabalho das equipes de Saúde da Família no país. Fica claro que, com os recursos adequados, a APS contribuiria de forma ainda mais decisiva para o enfrentamento da pandemia de COVID-19 no Brasil”, afirma a professora.
Com relação aos reflexos diretos da pandemia, a pesquisa mostra que a demanda de trabalho aumentou em 86% das UBS do país (em 56% houve grande aumento e em 30% houve aumento da demanda de trabalho), de forma generalizada nas diversas regiões. A quase totalidade das equipes (87,5%) informou estar sobrecarregada (48%) ou muito sobrecarregada (39%), com maior frequência de sobrecarga no Sudeste, Sul e Centro-Oeste. No entanto, os profissionais tinham acesso a apoio psicológico em somente 47% das UBS. É importante lembrar que, desde a PNAB 2017, a Estratégia Saúde da Família (ESF) tem sofrido forte redução de financiamento, com diminuição do número de ACS, abandono dos Núcleos de Atenção à Saúde da Família (NASF) e aumento da sobrecarga laboral já antes do advento da pandemia.
Principais resultados
- Acesso à Internet e computadores
O acesso à internet tem marcadas diferenças regionais, com piores condições na Região Norte, na qual apenas 58% das UBS referem possuir internet com qualidade adequada para as suas atividades, frente à média nacional de 76%. Apenas metade das UBS tem telefone fixo e somente 28% dispõe de celular. Os profissionais usam celular privado frequentemente para atividades de trabalho em 63% das UBS. A disponibilidade de computador com câmera e microfone e com conexão de internet, item essencial para a realização de consultas e acompanhamentos online, foi reportado por 27,5% das UBS
Neste estudo, sete das dez ações de Vigilância em Saúde (VS) investigadas apresentaram diferenças significativas entre as regiões do país. Ainda assim, em todo o país, as atividades de VS sob governabilidade das equipes das UBS mostraram um desempenho bom (busca ativa e acompanhamento de quarentena: 82%) e até mesmo ótimo (incentivo ao isolamento; monitoramento de casos e atividades educacionais: 87% ou mais das UBS realizam). As atividades que dependiam da gestão (testes, sistemas de informação) tiveram piores resultados.
- Organização do trabalho e dificuldades no enfrentamento da COVID
Diante da severidade da pandemia, 30% das UBS atendiam a casos graves, com porcentagens mais elevadas na região Sul (48%) e menores no Nordeste (20%). Houve a introdução de diversas e novas modalidades de acompanhamentos de usuário.
Os resultados indicam a necessidade de grandes investimentos no SUS e na APS, em especial no atendimento de pessoas com a COVID longa e o acúmulo das condições crônicas de difícil acompanhamento nos últimos dois anos. Para o controle da pandemia, é imprescindível ativar ainda mais os atributos comunitários das equipes; ampliar a associação às iniciativas solidárias das organizações comunitárias e articular-se intersetorialmente para apoiar a população em suas diversas situações de vulnerabilidade. É necessário também garantir a continuidade das ações de promoção, prevenção e cuidado, criando novos processos de trabalho para a vigilância em saúde e para a continuidade da atenção para quem dela precisa.
Internet e disponibilidade de testes são bastante diferentes entre as regiões. A região Sul em geral apresentou melhores resultados na disponibilidade de equipamentos, em relação às demais, principalmente em relação às regiões Norte e Nordeste.
A maioria das UBS utilizou principalmente telefonemas (85%), exceto no Norte, onde as visitas domiciliares foram a modalidade mais frequente de acompanhamento (77%). Chama a atenção a menor proporção de visitas domiciliares no Sul (59%) e Centro-Oeste (58%). A região Nordeste destaca-se pelo uso de videochamadas (27%), superior à média nacional .
Em outra direção, as UBS do Nordeste foram o destaque positivo da pesquisa na temática da Vigilância em Saúde.
Embora as UBS tenham mantido ações para continuidade do cuidado, houve diminuição da oferta de consultas para usuários portadores de doenças crônicas em 60% das UBS no país, sem diferenças significativas entre regiões, e isso foi atribuído a uma consequência da pandemia de COVID-19 . Tal redução teve impacto negativo, prejudicando o cuidado em cerca de um terço das UBS no país (34%).
As atividades de apoio social no território da UBS foram a dimensão com o menor desenvolvimento no enfrentamento da pandemia. Em 30% das UBS, foram empreendidas iniciativas de articulação com movimentos sociais e em 42%, houve articulação com outra organização ou instituição.
O relatório completo pode ser acessado aqui.
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Assessoria de Comunicação da Faculdade de Saúde Pública da USP
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