Pesquisa realizada por integrante do Nupens mostra que pessoas com mais idade e que vivem no Norte ou Nordeste do Brasil aderem mais às recomendações do Guia Alimentar

A nutricionista e pesquisadora Kamila Gabe

Desde a sua publicação, em 2014, o Guia Alimentar para a População Brasileira reúne orientações para uma alimentação mais saudável — entre elas, a regra de ouro que aponta para a maior ingestão de alimentos in natura e o menor consumo de ultraprocessados. Levando “população brasileira” no título, o documento considera a diversidade da nação quando apresenta, por exemplo, opções de refeições saudáveis de acordo com as cinco grandes regiões do país.

Que características, no entanto, podem fazer com que a população, em toda a sua diversidade, tenha mais ou menos adesão às recomendações do Guia? Foi essa uma das questões trabalhadas pela cientista Kamila Gabe, integrante do Nupens, em seu mestrado. A dissertação deu origem ao artigo “Práticas alimentares segundo o Guia Alimentar para a População Brasileira: fatores associados entre brasileiros adultos”, que contou com a participação de Patrícia Jaime, vice-coordenadora do Núcleo.

A pesquisa de Gabe destaca dois fatores que podem ser determinantes na manutenção de uma alimentação saudável: a idade e o local de residência. Ao analisar os resultados do estudo, a cientista comenta que o incremento da idade e o fato de residir nas regiões Norte e Nordeste do Brasil foram associados à maior pontuação em uma escala de adesão ao Guia Alimentar.

Isso significa que esses grupos tendem a fazer escolhas alimentares mais saudáveis, como preferir alimentos in natura e minimamente processados a alimentos ultraprocessados, e a ter modos de comer mais apropriados, como fazer refeições à mesa e de forma compartilhada. Além disso, tendem a ter maiores níveis de planejamento individual e organização no ambiente doméstico para aquisição, preparo e consumo de alimentos — aspectos que contribuem com uma alimentação saudável.

A maior adesão às práticas recomendadas pelo Guia nas regiões Norte e Nordeste vão ao encontro do resultado obtido na última edição da Pesquisa de Orçamentos Familiares realizada pelo IBGE, e que contou com a colaboração do Nupens.

“No Brasil, assim como em outros países, há uma tendência de transformações nos padrões alimentares das populações, sobretudo caracterizada pelo aumento da participação de alimentos ultraprocessados”, diz Gabe. “É importante, no entanto, ter cautela ao interpretar os resultados: existem outras variáveis sociodemográficas que podem influenciar na adesão às recomendações do Guia, como o tempo disponibilizado para o preparo de alimentos ou a exposição das pessoas à publicidade de ultraprocessados.”

Segundo ela, há duas formas de fazer com que as pessoas tenham acesso às orientações para estabelecer uma alimentação saudável. Uma delas é a comunicação, que deve ser feita principalmente pelos profissionais de saúde e de educação. A outra, é o uso do Guia para o embasamento de políticas públicas. “As duas frentes precisam estar coordenadas para que, ao mesmo tempo em que as pessoas se apropriarem das recomendações do Guia, os obstáculos para uma alimentação saudável sejam mitigados.”

Estudo validou ferramenta aberta a pesquisadores

O mestrado de Gabe incluiu a validação de uma escala criada em um convênio entre o Nupens e o Ministério da Saúde para medir o grau de adesão às práticas alimentares recomendadas pelo Guia. Em seu trabalho, a cientista analisou todas as orientações presentes (em texto e em imagens) no documento e, a partir delas, criou afirmações sobre alimentação. A ideia era gerar um folder educativo com um questionário prático, que gera um resultado de fácil interpretação do usuário. “No atual formato, a ferramenta tem 24 itens que representam as quatro dimensões do Guia: a escolha dos alimentos, os modos de comer, a organização doméstica e o planejamento individual”, diz Gabe.

Seu estudo foi o primeiro a usar a escala, que pode ser aplicada por outros pesquisadores de diversas áreas. A ferramenta vai além do campo científico, podendo ser usada por nutricionistas e outros profissionais de saúde. “O questionário tem um grande potencial para aplicação em serviços de saúde, sobretudo da atenção primária, servindo tanto com uma forma de apoiar diagnóstico alimentar de indivíduos ou grupos, como para realizar ações educativas de promoção da alimentação adequada e saudável.”

Leia a íntegra da pesquisa.