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Projeto “Coorte Araraquara” avalia estado nutricional de 2 mil gestantes e respectivas crianças

 “Relação entre adiposidade materna e adiposidade do concepto nos períodos fetal, neonatal e no primeiro ano de vida: estudo prospectivo de base populacional” -conhecido como “Coorte Araraquara”- é um estudo iniciado em 2017 numa amostra de 2.000 gestantes e seus conceptos, com o objetivo de entender os fatores genéticos e ambientais envolvidos na instalação precoce da obesidade desde a fase intrauterina.

Coordenado pela pediatra Patrícia Helen C. Rondó, professora do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, trata-se de um estudo epidemiológico longitudinal prospectivo envolvendo as 34 Unidades Básicas de Saúde (UBS) de Araraquara (SP), incluindo o Serviço Especial de Saúde de Araraquara (SESA) -ligado à FSP-USP-, bem como a maternidade “Gota de Leite” daquele município. 

Após a interrupção por 1 ano e 4 meses devido à pandemia da COVID-19, o estudo foi retomado ao final do ano de 2021. Além do atendimento no SESA, agora os pesquisadores farão os atendimentos também nas creches e nos domicílios dos participantes.

Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo-FAPESP (Projeto Temático), o projeto busca não somente avaliar o estado nutricional dessa coorte, mas também a composição corporal e os fatores metabólicos de mulheres nos três trimestres da gestação, relacionando com adiposidade do feto, neonato e criança nos 2 a 5 primeiros anos de vida na referida amostra, de 2.000 gestantes e seus respectivos conceptos. Também estão sendo investigados o estado inflamatório/imunológico, a expressão gênica e alterações epigenéticas em subamostra das gestantes.

Vale lembrar que a obesidade é considerada um problema de saúde pública mundial, predispondo a doenças crônicas como hipertensão, diabetes e câncer na idade adulta. Por esse motivo, a equipe do “Coorte Araraquara” busca entender todos os fatores genéticos e ambientais envolvidos na instalação precoce dessa patologia já desde a fase intrauterina. 

Existem outros três projetos acoplados ao “Coorte Araraquara”: 1) o primeiro projeto avalia a relação entre deficiência/insuficiência de vitamina D e síndromes hipertensivas da gestação; 2) o segundo visa investigar as microbiotas vaginais da mulher nos 3 trimestres da gestação (Auxílio Regular FAPESP) e intestinal do recém-nascido (bolsa de pós-doutorado FAPESP), visto que estudos atuais mostram que a flora microbiana vaginal da mãe pode ser protetora ou predispor a algumas doenças maternas e do concepto; 3) o terceiro projeto financiado pelo Medical Research Council, em parceria com o Institute of Child Health, University College of London, Inglaterra, tem o propósito de avaliar a saúde mental e a violência doméstica em gestantes.

 

Resultados preliminares

Até o momento, a “Coorte Araraquara” vem mostrando que, das alterações epigenéticas investigadas, como a metilação do DNA nos sangues materno e do cordão umbilical e tecidos do vilo e decídua placentárias, a obesidade materna e o excesso de ganho de peso na gestação alteraram a metilação total e em genes específicos relacionados ao metabolismo lipídico, mostrando também uma associação com a evolução do tecido adiposo dos descendentes nos períodos fetal e neonatal. 

O estudo também evidenciou a contribuição da expressão gênica materna e do cordão umbilical, particularmente expressão materna do PPARG e TLR4 e do IL-10 do cordão umbilical no peso, índice de massa corporal (IMC) e porcentagem de massa gorda do neonato (Nakandakare et al., 2021).

Em relação às determinações bioquímicas realizadas e a composição corporal dos conceptos, observou-se associações entre o IMC pré-gestacional, perfil glicêmico e lipídico maternos e ganho de peso na gestação com a adiposidade do feto e neonato.

Houve alta prevalência de estresse, depressão e ansiedade nas gestantes investigadas, compatíveis com resultados de estudo de coorte desenvolvido 20 anos atrás pelo grupo de pesquisa, em outro município do estado de São Paulo, com variáveis socioeconômicas e índice de desenvolvimento humano (IDH) semelhantes. Nesse trabalho anterior foi avaliado o estresse/distresse como fatores de risco para a prematuridade, o baixo peso ao nascer e restrições de crescimento intrauterino (Rondó et al, 2003). Interessante que as alterações mentais observadas atualmente foram mais acentuadas no início da gestação, provavelmente pelo fato de elevada parcela das mulheres não terem planejado a gestação.

De maneira geral, os resultados parciais do “Coorte Araraquara”, com artigos em vias de publicação, evidenciam a diversidade de fatores que podem estar associados à composição corporal e às velocidades de ganho de peso e ao comprimento dos conceptos, como o estado nutricional materno, ganho de peso na gestação, perfil glicêmico e lipídico maternos, sexo, peso ao nascer, fatores socioeconômicos, amamentação, morbidade infantil, além de fatores epigenéticos e de expressão gênica.

 

Contato:
Patrícia Helen C. Rondó – professora do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP.
Email: phcrondo@usp.br